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quinta-feira, janeiro 11, 2007

Cânone 6

No contexto do aparecimento do novo Código de Direito Canónico houve, necessariamente, a necessidade de definir e clarificar as suas fronteiras em relação ao CIC de 17. Por isso, este cânone, na linha dos cinco anteriores, visa esclarecer e definir a natureza e o alcance do mesmo, neste caso, em relação com o código anterior. Considerando o contexto em que este se elaborou (toda a época envolvente do Concílio Vaticano II) poder-se-ia pensar que viesse eliminar todas as normas legislativas anteriores e, com o impulso conciliar, renovar por completo o Direito. Essa é a ideia subjacente a uma primeira leitura do cânone e que não está muito longe da realidade como afirma o Papa na Constituição Apostólica Sacrae disciplinae leges: “a reforma do Código de Direito Canónico parecia ser vivamente pedida e desejada pelo próprio Concílio, que voltara principalmente toda a sua atenção para a Igreja”.
No primeiro parágrafo, número 1, afirma-se a ab-rogação do CIC de 17. Aqui verifica-se claramente o objectivo deste Código que, ao contrário do de 17 que tinha uma vontade geral de conservar generalizadamente a disciplina anterior, tem como um dos seus objectivos fundamentais, alterar a legislação a fim de a adequar ao estabelecido pelo Concílio.
No número 2 fica também definida a ab-rogação das “leis, universais ou particulares, contrárias às prescrições deste Código, a não ser que das particulares se determine outra coisa”. Esta salvaguarda das normas de Direito particular justifica-se na medida em que podem encontrar-se várias cláusulas onde se expressem a salvaguarda de determinada lei ou Direito particular (p.e. c. 288; c. 1561, etc.). Contudo, “existem muitas outras indicações do código acerca da eficácia do Direito ou da lei particular, ainda que não exprimidas como excepções expressas, mas sim como normas dispositivas nas quais o Código subroga a sua norma à particular, ou ainda, promove a eficácia do Direito particular”.[1] Neste âmbito podem-se também incluir o “jus proprium” dos institutos de vida consagrada, por exemplo. Contudo os estatutos não são leis, mas se aprovados pela autoridade legislativa competente, também se vêm afectados pelo cânone 6.
No número 3 afirma-se que ficam ab-rogadas todas as leis penais, universais ou particulares, contrárias ou não recebidas por este Código, mesmo as de carácter pontifício, emanadas pela Sé Apostólica. Contudo, não se incluem neste cânone as leis processuais penais e mantêm-se as leis penais procedentes de legisladores inferiores à Santa Sé, se não entrarem em confronto com os cânones. Ao entrarem em vigor estas normas, tem-se ainda em conta que o princípio de benefício do culpado e exige-se uma “retroactividade favorável” da lei penal.
O número 4 afirma a ab-rogação das “outras leis disciplinares universais respeitantes a matéria integralmente ordenada neste Código”. Assume-se assim, claramente, a reordenação integral da matéria como forma de ab-rogação da norma universal. Mas tal tarefa não é fácil já que a reordenação “ex integro” compreende a estrutura geral de uma instituição jurídica. Contudo, algumas normas jurídicas anteriores ao Código não são submetidas a reordenação integral, tais como: as independentes do Código, ou seja, sobre matérias não reguladas, não referidas no Código; as de referência explícita em que o Código refere de modo expresso como “lei especial”, “lei peculiar”…; as leis referentes à Sé Apostólica, à eleição do Papa, Sínodo dos Bispos, Cúria Romana, processos de beatificação e canonização, regime de indulgências e outros; e ainda as de contenção implícita, ou seja, as norma que, embora o CIC não remeta directamente para elas, vêm requeridas, sem dúvida, para o desenvolvimento operativo de uma instituição ou organismo de que o CIC disena a sua natureza e funções primordiais.
Por fim, o parágrafo 2 refere o recurso à tradição canónica ou seja ao “ius vetus”. Exprime-se que os cânones deste Código, na medida em que reproduzem Direito antigo, devem ter em conta, na sua compreensão, a tradição canónica. Contudo há que entender que por Direito antigo não se entende apenas o CIC de 17, mas também o Direito histórico, o clássico, etc. Mas a tradição canónica não é o único item a ter em conta na compreensão dos cânones. Temos de ver que antigamente não havia disponível toda uma série de comentários a um Direito codificado. Por isso, os cânones que contenham “ius vetus” necessitam da tradição canónica que faz o seu respectivo enquadramento evitando os possíveis erros ou anacronismos. Convém ter em conta que comentários, tratados, etc., são elementos essenciais para se compreender uma boa parte deste Código que, reformulado com o ímpeto Conciliar, não deixa de ter uma fonte basilar no Código antigo.



Bibliografia

PARALIEU, Roger, Guia prático do Novo Código de Direito Canónico, Gráfica de Coimbra, Coimbra 1984.

Universidade de Navarra/Instituto Martín de Azpilcueta – Código de Direito Canónico. 2ª Ed anotada a cargo de Pedro Lombardia e Juan Ignacio Arrieta. Braga: Theologica, 1997.Universidad de Navarra/Instituto Martín de Azpilcueta/Facultad de Derecho Canónico – Comentario exegético al Código de Derecho Canónico. Coord. de A. Marzoa, J. Miras e R. Rodríguez-Ocaña. Pamplona: EUNSA, 1996; Vol. I.




Pedro Daniel Faria Marques
3.º Ano de Teologia
N.º 747