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segunda-feira, janeiro 15, 2007

Cânone 5
O cânone 5 insere-se no contexto dos costumes «vigentes in praesents», “actualmente em vigor”, quer já implantados, ou em situação de consolidação: não diz respeito a futuros costumes. Por outro lado, o seu propósito é determinar estes mesmos costumes na sua relação com a lei. Não interessa ao Legislador qualquer outro tipo de legitimidade ou ilegitimidade dos costumes, ou se quer a legitimidade ou ilegitimidade que resulta da sua relação com “os preceitos destes cânones”. Por esta mesma razão, não são afectados por este cânone os costumes sobre matéria litúrgica.
A definição de costume aparece nos cânones 23 a 28. Podemos definir costume como um uso continuado da comunidade que, quando cumpre os requisitos estabelecidos, chega a ter força normativa igual à lei. Outra definição clássica apresenta o costume como um norma não escrita, de carácter geral (como a lei), introduzida por usos comunitários e cuja eficácia jurídica é corroborada pelo legislador. Por outro lado, estes podem ser particulares, quando são territoriais ou pessoais, ou universais, isto é, comuns a todos os fiéis sejam quem forem, ou independentemente do lugar onde vivam
De volta ao cânone 5, reparamos que é claramente restritivo: “a não ser que expressamente se determine outra coisa no código ou sejam centenários ou imemoráveis, os quais podem tolerar-se se, a juízo do ordinário, segundo as circunstâncias dos lugares e das pessoas, não puderem ser suprimidos.”
O cânone 5 pressupõe quatro hipóteses de costumes em relação com a lei e atribui propriedades diferentes a cada um deles. Assim:


-Costumes Contra Legem expressamente reprovados pela lei.
Se um costume se opõe a uma norma do Código que contenha uma cláusula de condenação do costume, os efeitos são absolutos: seja centenário ou não, deve ser “inteiramente suprimidos, e não se permita a sua reviviscência”. Esta é uma indicação do segundo ponto do cânone 24: “o costume expressamente reprovado no direito não é razoável.” A racionalidade é o fundamento radical que o direito exige para que o costume alcance «força de lei». A forma de reprovação deve estar expressa, deve constar da formulação textual do cânone, mas que são escassos. Exemplo: segundo ponto do cânone 396.


-Costumes Contra Legem, centenários ou imemoriais não expressamente reprovados pela lei e impossíveis de suprimir
Os costumes contrários ao código sejam também suprimidos, mas se não têm contra uma cláusula de reprovação expressa, os efeitos da sua supressão são distintos. Só a reprovação provoca a incapacidade de reviviscência (“nec in posterum revivescere sinantur”). Além disto, entre os costumes que são simplesmente contrários aos cânones, têm um estatuto especial os centenários e imemoráveis, ou seja, aqueles que no momento da promulgação do código já tenham cem anos, ou que seja impossível determinar a sua origem. Neste pressuposto, o código, embora os considere suprimidos como princípio geral, admite a possibilidade de tolerância.
Para isso é necessária a opinião do Ordinário sobre a impossibilidade da sua supressão, que é exposto através de um decreto de tolerância, ou então através de algum acto de jurisdição que embora tenha outro objecto imediato, certifique suficientemente a tolerância do costume. Como adverte o cânone 5 deve ser emanado do Ordinário, e não de um Legislador, não se trata por isso de um elemento constitutivo do costume como fonte do direito, mas de um requisito imprescindível para a sua vigência embora externo ao próprio costume.

-Outros costumes Contra Legem não expressamente reprovados pela lei.
Como vimos, só os costumes centenários ou imemoráveis têm a condição privilegiada de prevalecer (de ser tolerados) contra o Direito. Todos os outros costumes que são contrários, para que conservem o seu vigor jurídico, devem ser aceites explicitamente pelo próprio código. Isto ocorre em diversos cânones que apresentam um costume como norma que a lei universal respeita como uma alternativa distinta da lei. São inúmeras as situações em que o Código de Direito Canónico remete para o costume sem que haja uma nota de excepcionalidade ou de contrariedade à lei mas também como norma directamente aplicável, em alternância com outras fontes de Direito Particular; e também como norma suplementar à lei. Estes pressupostos não estão contemplados directamente no cânone 5.1, já que não são costumes contrários excepcionalmente admitidos, mas costumes segundo a lei, modos concretos de cumprir o conteúdo da lei escrita, ou se quisermos, normas consuetudinárias promovidas ou oferecidas pela mesma lei. Contudo, a lei consuetudinária segundo a lei opera evidentemente em todo o âmbito do ordenamento jurídico e não se reduz a estes casos.

-Costumes Praeter Legem
A uniformidade da disciplina universal por parte do Código de Direito Canónico de 1917 levou grande parte da doutrina canónica a entender que apesar do seu silêncio, o código antigo revogava o costume universal «praeter legem». O segundo ponto põe fim a uma situação que se considerava ambígua durante a vigência do Código anterior. Agora adverte-se expressamente que subsistem os costumes extra-legais que estão actualmente vigentes, sejam particulares ou universais.



Tema apresentado em aula.
Márcio Ferreira
Teologia, nº 745