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domingo, dezembro 10, 2006

Análise do Cân. 28

Salvo o disposto no can. 5, o costume quer contra a lei quer para além dela, revoga-se por costume contrário ou por lei: porém, a não ser que deles faça menção expressa, a lei não revoga os costumes centenários ou imemoriáveis, nem a lei universal os costumes particulares.

Este cânone encontra a sua fonte no can. 30 e está intimamente ligado, como ele próprio faz referência, ao can. 5, 20, 23, 26, 135 § 2 e can. 392.

De uma forma sucinta, o cânone apresenta um princípio geral - a revogação de um costume -(que pode ser um costume ou lei contrária) e três princípios excepcionais de natureza e extensão distintos. O primeiro refere-se aos que estão isentos ou não são afectados (por referência explícita e estabelecimento prévio), ou seja, o can. 5. Isto porque os costumes vigentes aquando da promulgação do CIC devem ser valorizados de acordo com as disposições do cânone introdutório acerca do Direito consuetudinários. As outras duas cláusulas referem-se aos costumes privilegiados (centenários ou imemoriais) e aos costumes particulares. Ambas gozam de especiais condições de revogação.

  1. Revogação do costume por costume contrário

Esta é a primeira cláusula do can. 28. Se entendermos que há uma equiparação entre a lei e os costumes, então o costume, tal como a lei, pode ser revogado por um costume contrário. Não se trata de uma situação frequente, pelo contrário. Uma comunidade pode introduzir um costume contrário ao primeiro. Quando isto acontece, normalmente a comunidade que introduz o novo costume não é a mesma que primeira – esta normalmente é uma comunidade mais abrangente -. Para que o efeito do primeiro costume cesse e vigore o segundo são necessários alguns requisitos. O can. 26 fala do prazo de trinta anos para o costume «iuri canónico contraria».

  1. Revogação do costume por lei contrária

Das várias possibilidades de revogação de um costume, este é o mais frequente. Os tipos de obrogação são, porém, muito diversos e as suas diferenças devem-se essencialmente a:

  1. Âmbito territorial (universal ou particular) do costume revogado; 2) Âmbito territorial (universal ou particular) da lei revogatória; 3) Vontade (qualificada ou não) da lei revogatória; 4) Natureza privilegiada (centenária ou imemorial) ou não do costume que se revoga.

A lei revogatória de costume universal

A lei universal revoga o costume universal contrário, se não for centenário ou imemorial. A lei universal não precisa manifestar explicitamente, através de cláusulas derrogatórias, a sua intenção de revogar o costume universal. Basta que seja directamente contrária.

  1. A lei revogatória de costume particular

Para os costumes particulares, o can. 28 estabelece um regime especial. O Romano Pontífice (ou autor da lei universal) pode derrogar todo o fenómeno normativo universal (porque se pressupõe serem do seu conhecimento), mas os costumes e lei particulares, que consistem num facto, podem ser do seu desconhecimento. Portanto, se uma lei particular for razoável, a nova lei não as derroga, a menos que o faça explicitamente. Esta é a «expressa mentio» que fala o can. 28. Por menção expressa podemos entender uma advertência derrogatória genericamente compreensiva ou uma indicação derrogatória que expressamente advirta o que derroga: o costume particular.

  1. A lei revogatória de costume centenário ou imemorial

Esta particularidade não oferece grandes dúvidas. Para abrogar este costume particular mediante uma lei universal seria necessário uma menção especificamente expressa: a nova lei (universal ou particular) deve advertir que revoga também os costumes centenários ou imemoriais.

  1. O autor da lei revogatória do costume

Esclarecidos os requisitos gerais para a revogação de um costume, falta ainda esclarecer quem é o legislador competente para o revogar o costume por meio de uma lei.

O can. 135 § 2 adverte, desde logo, que um legislador inferior não pode dar uma lei contra o Direito de nível superior (um legislador particular, por exemplo, não pode ir contra uma lei da Cúria Romana). O mesmo é dizer que um legislador particular não poder dar uma lei revogatória de cariz universal contra a lei, se esse costume tiver obtido a perfeição normativa por cumprimento dos prazos prescritos pelo direito.

Outro caso seria o da possibilidade de uma legislador particular inferior (por exemplo um Bispo) dar um lei revogatória de um costume contra a lei de um legislador particular de hierarquia superior (por ex. Conferência Episcopal). Os autores tendem a confirmar esta possibilidade, ainda que com reservas e limites. O legislador particular tem, isso sim, o dever / direito de vigiar o cumprimento da disciplina universal da Igreja (can. 392). Assim, todo o legislador particular pode revogar um costume contrário à lei universal (ou particular de maior grau) se a comunidade introdutória é um grupo social proporcional ao poder do legislador.


Tiago Freitas • 717